segunda-feira, 26 de maio de 2025

O amor está aqui em algum lugar no mundo, é preciso acreditar (Crônica afetiva para tempos sem afeto)

Dizem que o amor existe. Eu também já disse isso — em voz alta, inclusive, pra ver se convencia o espelho. Mas hoje, se me perguntarem, eu hesito. O amor está aqui em algum lugar no mundo, dizem. E eu reviro as gavetas, os bolsos da alma, os restos de fé esquecidos debaixo do tapete. Encontro de tudo: recibo de ex, boleto de saudade vencida, cartão-postal do “quase” com carimbo borrado. Mas o amor? O amor está sempre saindo pela porta de emergência.

Já acreditei nele como quem acredita em disco voador: não vi, mas jurei que era real só porque queria muito. Aí vieram os amassos, os jantares à luz de vela (com conta dividida e silêncios longos), as promessas feitas em noites bêbadas e desfeitas nas manhãs de ressaca emocional. O amor estava lá? Talvez. Mas era tímido. Tão tímido que só se deixava ver de relance, como aquele fantasma que atravessa a sala quando a gente está sozinho e cansado demais pra gritar.

No colégio, disseram que o amor era coisa de príncipe e princesas da Disney. Depois, na vida real, descobri que príncipes e pricesas andavam de Uber, sumiam no dia seguinte e às vezes pediam pra “ver onde isso vai dar” — e o “isso” geralmente dava num abismo chamado “não é bem o que eu tô procurando agora”. Eu? Tava procurando o amor. Elas? Um wi-fi emocional pra se conectar quando a solidão dava sinal fraco.

Todo mundo insiste: “O amor está aqui em algum lugar no mundo”. Mas e se ele tiver mudado de nome, feito harmonização facial, virado coach de relacionamentos tóxicos? Às vezes acho que o amor foi demitido, terceirizado por carência, substituído por like, cafuné com data de validade e sexo que começa com Tinder e termina em terapia.

Você me diz pra acreditar. Eu sorrio com os dentes, mas não com os olhos. Acreditar é bonito — mas também é cansativo. Já queimei a língua em sopa fria de paixão, já construí castelo com areia movediça, já plantei carinho e colhi cacto. Ainda assim, sigo tentando, como quem joga moeda no poço achando que é fonte dos desejos, mas o único desejo que se realiza é o do poço com mais uma moeda.

Às vezes penso que o amor é um bicho em extinção. Está lá, escondido em alguma floresta emocional, esperando que a humanidade pare de gritar. Quieto, ferido, desconfiado. Eu entendo. Eu também ando assim.

O amor está aqui em algum lugar no mundo, eu sei. Talvez esteja dormindo, cansado de tanto ser confundido com carência. Talvez esteja perdido num ponto de ônibus, sem sinal no celular. Ou então, o mais provável: talvez o amor seja esse lugar que nunca cheguei, mas continuo tentando alcançar mesmo sem saber a direção — só pra não morrer parado.

Afinal, acreditar dói. Mas desaprender a crer... ah, isso mata por dentro, devagarzinho. Feito amor não correspondido.

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