Para
ser bem direto é possível dizer que o Classicismo é a literatura do
Renascimento, mas isso é limitar muito o que seria um período espetacular do
engenho humano.
É claro que
não há espaço neste ensaio pra se aprofundar em tudo, encerrar o assunto impossível,
mas pra ser bem objetivo neste aspecto: no Renascimento surgem gênios do
calibre de Dante, Montaigne, Maquiavel, Petrarca, Erasmo de Roterdã, Camões, Michelangelo,
Donatelo, Boticcelli, Rafael, Da Vinci, Shakespeare, Cervantes, Galileu, Copérnico...
Foram
três séculos que revolucionaram a história humana, dos mil e trezentos aos mil
e quinhentos. E com certeza você já ouviu falar de algum dos nomes do parágrafo
anterior. Deles ou de alguns dos objetos inventados, utilizados ou
desenvolvidos para uso prático como a bússola, o astrolábio, as caravelas, os
mapas.
Nos
mapas, na minha opinião, há a principal diferença entre o homem do Renascimento
e o medieval. Nos mapas anteriores a 1200 quando o cartógrafo não conhecia
algum lugar inventava um desenho, e o trabalho do geógrafo se aproximava muito
do de um artista: inventando imagens, criando coisas, abismos, monstros.
Como quem
tem... tem medo, os primeiros navegadores aos utilizarem esses desenhos não se
atreviam a navegar nestes locais.
Já os
cartógrafos dos séculos imediatamente posteriores deixavam lacunas a serem
preenchidas por aqueles que por acaso se atrevessem a por lá navegar, ou se por
terra, caminhar.
Isto
representa um dos maiores triunfos da mente humana que significa tão
simplesmente reconhecer que não se sabe. E reconhecer não saber é o primeiro
passo para qualquer indivíduo buscar aprender. A partir desta premissa os mapas
foram desenvolvidos, cruzamos a América, inventamos submarinos, chegamos à Lua.
No
meu humilde ponto de vista o Renascimento foi o momento histórico em que as
pessoas começaram a reconhecer que não sabiam, fundando assim algo que no
futuro seria conhecido como “método científico”. Que significa que algo para
ser tido como verdade deve ser testado, analisado, comprovado, refutado,
questionado até que não haja dúvidas a respeito. Mais ou menos como faziam os
gregos na antiguidade.
Sim,
o vocábulo Renascimento vem da união da palavra nascer com o sufixo re que
significa voltar a.
Se renascimento
significa voltar a nascer, quando se nasceu pela primeira vez?
E a resposta
está nos clássicos, os gregos. Eles foram os primeiros a questionar o
conhecimento anterior fundando o que poderia ser entendido como o prenúncio do
que hoje é o método científico.
Diretamente
podemos afirmar que o pensamento racional nasceu na Grécia, foi enterrado na
Idade Média (embora eu discorde disso, mas tudo bem, bola pra frente) e
renasceu no Renascimento dando início ao que conhecemos em história como
Modernidade.
Como
o foco aqui é literatura, fica aqui o convite para que você busque conhecer um
pouco de todos aqueles caras citados no terceiro parágrafo deste texto, são
excelentes. Por hora ficamos com o que foi feito em Língua Portuguesa.
E
também é muito interessante esse período para nós da comunidade em língua
lusitana porque Portugal, no que se refere a navegações, foi um dos
protagonistas do Renascimento. Vasco da Gama (o navegador, não o clube... piada
péssima) foi o sujeito histórico que descobriu uma forma de navegar ao sul da
África e chegar às Índias por um novo caminho, ajudando a preencher uma das
maiores lacunas daquele tipo de mapa citado acima. Pedro Álvares Cabral aportou
por aqui preenchendo com mais terra o mapa mundi, ajudando-o a tornar-se o que
é hoje.
Da
viagem de Cabral ficamos nós, da de Vasco da Gama ficou um livro conhecido como
o maior exemplo de epopeia em língua portuguesa: Os Lusíadas. Livro que conta a
história real da descoberta do novo caminho para as índias, mas de forma a
engrandecer o povo português de tal modo que até os erros históricos soassem
como acertos divinos.
O grande herói
d’Os Lusíadas não é Vasco da Gama, mas o povo português, sua história, seus
grandes feitos, sua fundação, seus amores (como o episódio de Inês de Castro)
ou sua força ante os deuses (como no episódio do Gigante Adamastor).
Tudo muito grandioso
e entediante aos olhos de um rapaz do século XXI. E deixa eu confessar: aos
olhos de um rapaz do século XVI também. Sim, este livro não foi feito para ser
popular, nem admirado no mundo inteiro. Ele se utiliza de uma história já
contada: A Odisseia, de Homero, que também narra aventuras no mar e adapta a
algo grandioso feito pelo povo português. Nada que algum dia tenha seduzido um
jovem leitor de aventuras marinhas, ou não?
Não me levem a
mal professores de literatura e acadêmicos fãs de Camões, reconheço que os
Lusíadas foram um marco espetacular para uma nação que vinha a toque de caixa a
tornar-se o país mais poderoso do mundo e que, a história nos prova, deu o
passo maior que as pernas. Portugal teve seu rei Dom Sebastião morto buscando
ampliar os domínios territoriais lusitanos, e sem deixar herdeiros passa para
as mãos do Reino Espanhol.
Camões estava
ciente disto até mesmo em sua obra prima. Há um episódio conhecido como O velho
do Restelo, em que um velhinho, ao ver os barcos saindo para alcançarem novas
terras, espalharem o domínio português buscando riquezas alega que estão
esquecendo-se do povo português em Portugal e que aquilo não vai acabar muito
bem. Vale como registro histórico maravilhoso porque é percebido neste momento
que nem todos concordam com os caminhos ditados pela corte portuguesa aos rumos
do reino. Também é importante ressaltar que o velhinho chato que parece estar
ali apenas para mostrar a inveja dos invejosos tinha razão. E como tinha razão.
Tanto foi que
no século posterior, dominado pelo movimento Barroco. A literatura em língua
portuguesa dá a tônica do que apequenamento de Portugal pois nenhum escritor de
calibre ousou escrever em Língua Portuguesa, tanto que os maiores escritores
barrocos portugueses estavam no Brasil: Gregório de Matos e Padre Antônio
Vieira. Dois assuntos para outro momento, inclusive se este parágrafo é
verídico ou não.
Voltando ao
Classicismo em Portugal vale ressaltar que o soneto, uma composição poética formada
por quatorze versos decassílabos, divididos em quatro estrofes: dois quartetos
e dois tercetos; foi introduzida e desenvolvida à náusea. Os sonetos de Camões
são em grande medida uma parte menor de sua obra, tidas assim até pelo próprio.
Apesar da grande popularidade e beleza de alguns, vale ressaltar que muitos são
simples versões de sonetos do italiano Petrarca, outros inclusive com trechos
todos copiados. Alguns maravilhosos, é claro, mas ainda assim falta à sua
lírica (os poemas) o que tem em sua épica (os Lusíadas).
Mas
originalidade era algo menor neste período. Note como ao longo da história
anterior ao renascimento o conceito de autoria era muito relativo. Não era dado
a conhecer o nome do autor de muitas obras pelo simples fato de que ninguém se
importava muito com isso. Era como se fosse pedido para alguém da gráfica fazer
um convite de casamento e virem todos assinados pelo José da Silva, responsável
pela sua formatação. Os quadros anteriores a este tempo não valorizavam a
individualidade, o trabalho humano por trás de si. Outro grande mérito desta
época: sabemos quem criou o que criou, como criou e porque criou. Ou, ao menos,
podemos atribuir autoria. As obras começaram a ser assinadas.
Valorizar a
racionalidade é dizer pouco porque as lacunas ainda estão sendo preenchidas: o
homem pôs satélites em órbitas, e quando falo o homem falo de você e eu também.
Porque quando um indivíduo de uma espécie é capaz de realizar algo significa
que todos são. Portanto todos pisamos na lua com o pé de Armstrong, pilotamos remotamente
o Mars Rover em Marte, pousamos uma espaçonave num cometa, enxergamos através
de galáxias com o telescópio Hubble, estamos viajando nos confins do Sistema
Solar com a sonda espacial Voyager, aumentamos a expectativa de vida em
décadas, curamos doenças milenares como a varíola e a sífilis, desmontamos a
cilada malthusiana através do abastecimento maciço de alimentos ao redor do
mundo e é claro temos todos os problemas referentes a isso porque, mesmo hoje,
ainda há pessoas vivendo como se o Renascimento e suas conquistas posteriores
jamais tivessem existido.
A Modernidade não
chegou para todos, para alguns ainda nem os sentimentos de igualdade, liberdade
e fraternidade da Revolução Francesa que veio séculos depois não se anunciaram.
Isto é uma questão urgente em que se deve trabalhar: utilizar da racionalidade
para desenvolver mecanismos para que todos tenham acesso aos benefícios do
preenchimento das lacunas através do conhecimento que apenas o método
científico pode trazer.
E para ler
mais um pouco a respeito recomendo um livro maravilhoso de um cara chamado Carl
Sagan, chamado “O mundo povoado pelos demônios”. Nele Sagan nos diz da importância
da utilização do método científico para o benefício da humanidade.
Sobre arte
recomendo “A história da Arte” de Gombrich. Que é profundo e leve ao mesmo
tempo.
“Sapiens – Uma
breve história da humanidade” é um livro fundamental para entender tudo o que
se passa por nossas cabeças. Vale ler e reler.
“Breve
história de quase tudo” de Bill Bryson é um livro elegante que não pode deixar
de ser lido por ninguém.
Dito isto,
apenas espero que o equilíbrio entre fé cega e racionalidade absurda esteja em
dia na sua vida, porque no século XVI a igreja cobrou a conta destes quase
trezentos anos de liberdade e razão. Que venha o Barroco!
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