domingo, 9 de junho de 2013

Lobão, anos 90 e Macunaíma

           Acabo de ler o livro do Lobão e não me contenho em rabiscar algumas linhas a respeito do "polêmico" Manifesto do nada na terra do nunca.
         Queria vir do começo e o começo vem anterior à leitura do livro. O começo está nas aspas da palavra polêmico do parágrafo acima, pois foi um livro que muitos não leram e mais que muitos falaram mal. Topei o desafio do lobo e li.
          Segundo o autor o seu manifesto é um ótimo mote para tomar uma cerveja e abrir discussões, ampliar horizontes.
          Eis-me aqui lobo mau, convido-o a uma cerveja e como sei que não aparecerá, abro-a aqui e bebo só. Seu gole dou ao santo.
          Primeiro quero tratar do seu título: quem falou que você é o nada? Não que seja um elogio, segundo você mesmo: um hitmaker com mais de duas dezenas de sucesso, repórter, escritor, shows lotados, conhece todo o Brasil, já morou em Los Angeles. Se você é o nada, que dirá de mim que nem toco gaita direito, nunca saí de Guarulhos, tenho parcos textos publicados e não tenho o mercado editorial a meu favor pra concorrer a um prêmio Jabuti. É Lobão, o seu ser nada é só retórica.
          Mas o restante me agradou muito, exceto a sua carta ao Oswald de Andrade, de extremo mau gosto e sem propósito. Mais certo seria uma carta aos péssimos leitores de Oswald, os que o leram e não entenderam nada, e e mesmo assim o interpretaram e passaram adiante de forma feia e tosca. O Manifesto Antropofagista é um deboche e Oswald o via assim, assim como o Macunaíma não pode ser lido como um elogio à preguiça ou displicência. Ambos são o que são: textos literários e, Lobão, com licença, você não faz literatura: manifesto, biografia e música. Aí o nada o beira.
            Pra discutir um texto literário tem que ser literato, ou antes, analisá-lo com as ferramentas adequadas. Fazer como fez é como usar um arpão pra pescar uma sardinha, uma machado pra colher uma rosa.
          Mas falando do Brasil, concordo com a sua leitura que é óbvia e que ninguém quer comentar, o rei está nu, mas tem muita gente ganhando com isso. Mesmo com a nossa guerra civil particular em que 110 mil mortes violentas não geram atitudes políticas apenas mais programas televisivos violentos mostrando as faces da morte em horário nobre, empresas de segurança, políticos prometendo mudança, traficantes ganhando poder, milhares morrendo, ninguém sendo preso, nem ricos, nem pobres.
          50 mil assassinatos sendo que 10 mil já podem ser considerados uma guerra civil, mais o bônus de 60 mil mortes no trânsito, o mais violento do mundo, o mais violento porque não pune ninguém.
          Dessa forma caminha seu texto, porque assim é o Brasil. Aprendi muito quando você falou sobre música, a paumolecência do rock nacional. São seus melhores momentos no livro, quando fala sobre música: a cambada do sertanejo universitário. Você sabe do que está falando quando diz o que diz sobre este ritmo (?) e quando discorre sobre a máfia do dendê, a MPBização da música. Nada disso novidade, mas tudo muito certo.
             Até eu escrevi um texto sobre isso neste blog "A cabeça do objeto" há uns dois meses tratando do Funk, da farsa dos ritmos universitários. Você acerta no que diz e vai além, põem a coca cola na garrafa e vende. Mais uma prova que você não é o nada: eu falando tive meus parcos leitores, você ganhou uma grana com isso e com o bônus: ninguém pirateia livro no Brasil. Vendeu e vende. Parabéns.
             Querer matar a presidência é uma boa, os motivos são corretos, mas já falam disso desde Lincoln, a comissão da verdade deve ser mais discutida, boa sacada. Tem um filme on line chamado "Reparação" que ajuda bastante no debate e outro "O dia que durou 21 anos" que faz um contra ponto. Tudo não tem dois lados, mas vários. Acredito que a esquerda queria um golpe, só não acredito que o golpe da direita foi fruto disso, há documentos que provam o contrário.
           Discutir isso agora é que é um problema, fato: os anos 90 foram muito mais violentos que o período da Ditadura Militar. Também há documentos que comprovam isso. E se não bastarem os documentos, havia eu adolescente na periferia de Guarulhos com um cadáver por dia, uma chacina por semana, vários Carandirus ocultos. Vamos abrir os arquivos dos anos 90, quantos amigos meus foram mortos pela polícia, quantos policiais foram mortos por bandidos (pais de família com um revolver calibre 38 e sem colete a prova de balas), quantos meninos de 12 anos foram sequestrados e mortos para vingar a morte, a prisão de alguém.
            Quem vai indenizar as mães que perderam seus filhos nas chacinas semanais dos anos 90?
           Isso vai muito além da masturbação mental de discutir anos de chumbo, ditadura, ditabranda... Isso vai na direção de se discutir uma mudança de paradigma. Matava-se por um por um par de tênis. E o agora? Fruto desse ontem? O agora é Full HD. Não temos manifestantes, não queremos crescer, mas temos manifestos surgidos atrás das paredes de condomínios. Atrás da tela brilhando uma comunidade virtual.
               Em suma, bom livro para um país que traficante cheira, puta goza e Caetano é intelectual. Sou mais você falando que ele, e o que é pior, sou mais você cantando e escrevendo também...
           

Nenhum comentário:

Postar um comentário