quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

Greve dos caminhoneiros, pedágios e trem de Guarulhos (que não te leva até o aeroporto)


Resultado de imagem para ferrovia antiga guarulhos            A greve dos caminhoneiros apenas comprovou o que todos já sabem: o Brasil é um país irresponsável.
                Irresponsável e sem memória. Somos nós brasileiros o suprassumo do descaso.
                Essa greve se iniciou quando feita a opção há mais de cinquenta anos pelo transporte rodoviário em detrimento ao ferroviário, um cúmulo num país de dimensões continentais não haver ferrovias cortando o país de fora a fora levando carga e pessoas a um custo mais acessível, gerando concorrência entre os modais.
                Não acredito estar sendo infantil exteriorizando minha indignação em vez de apresentar uma visão mais científica, como é o caso corrente deste blog. É que está tudo tão na cara. Não vejo motivo algum para numa cidade como Guarulhos, por exemplo, terem extinto as linhas de trem para implantação de transporte sobre rodas. Não por coincidência na mesma época do presidente Juscelino abrir o Brasil para as grandes montadoras.
                Acredito ter havido uma onda rodoviária encabeçada por mídia e marketing bem elaborado, levando a população pensar que ônibus (no caso de Guarulhos) e caminhões fossem uma melhor opção.
             O paisano médio não tem que se preocupar com a mobilidade da cidade e logística de cargas ao redor do Brasil, tem coisas mais imediatas a pensar tipo: como chegar ao trabalho pela manhã e voltar pra casa à noite.
                Engraçado e trágico que no mesmo ano da reimplantação do transporte sobre trilhos em Cumbica (um trem que leva ao aeroporto que não chega ao aeroporto), então, no mesmo ano da reimplantação do trem guarulhense ocorre a greve dos caminhoneiros parando o Brasil inteiro, fechando rodovias e desabastecendo postos de gasolina, mercados e hospitais.
                Esse caos foi gestado há muito tempo, mas ganhou esta grandiosidade também por conta dos últimos vinte anos de governos com políticas de crédito irresponsáveis. O que aconteceu?
                Nas duas últimas décadas foi dado incentivo para a população comprar veículos pesados, os caminhões. Que transportavam diuturnamente commodities do interior para os portos, e produtos xing ling dos portos e aeroportos para o interior do Brasil. Quanto mais faltavam caminhões mais o governo incentivava o crédito, mais se compravam caminhões. O preço do frete nas alturas. Era muito bom para todos (todos?).
            A China, o maior comprador de aço, minérios e tudo o que era produzido aqui, crescia dois dígitos ao ano. O saco parecia não ter fundo. Fizemos uma copa do mundo, por que ferrovia? Fizemos uma olimpíada.
Resultado de imagem para estrada brasileira norte                Quando a China parou de crescer tanto, (tanto, porque ainda cresce invejáveis seis a oito por cento ao ano) as empresas brasileiras pararam de vender e comprar e demitiram pessoas que também pararam de comprar. Tudo isso levou-as a transportarem menos. Com muitos caminhões no mercado e pouco a ser transportado o capitalismo mostra o que tem de mais racional e alguns diriam selvagem: muita oferta, pouca procura, preço no chão.
                Em qualquer país civilizado os caminhoneiros que não conseguissem bancar seus caminhões mudariam de ramo, o mercado se adaptaria. Alguns bancos tomariam alguns caminhões, seriam obrigados a negociar as dívidas com os caminhoneiros porque nenhuma instituição financeira quer ser dona de vários caminhões apodrecendo e desvalorizando-se em pátios de leilão. Alguns transformariam seus veículos em oportunidades de outros negócios e bora tocar a vida e crescer realizando nossos sonhos.
                Não no Brasil. No Brasil os caminhoneiros exigiram que o governo federal instituísse uma tabela para fretes obrigando os contratantes a pagar um valor mínimo quando o mercado claramente dizia que o preço pelo seu produto (o frete) já não valia o que valera há anos. Havia (há) um excesso de produto, mão de obra rodoviária, e uma baixa procura. Ou seja, é possível negociar um preço mais baixo por este serviço, o que é triste demasiado triste, mas é o que ocorre numa livre economia de mercado.
Resultado de imagem para ferrovia suiça
                Mas como foi dito na primeira parte deste texto, no Brasil o transporte rodoviário é onipresente, magnânimo e não está disposto a entender de economia básica. Se não se transporta pelas rodovias, que tal as hidrovias, ferrovias, transporte aéreo? Em caso de greve, ou lock out, como foi o caso, algum problema haveria, mas nunca o caos.
No Brasil o caos foi implantado cinquenta anos atrás e impulsionado nos últimos dezesseis por irresponsáveis governos populistas que não pensaram em nada além de se perpetuarem no poder através de uma agenda no mínimo estúpida, para não dizer criminosa.
Ao fomentar o uso de automóveis e caminhões criou-se a necessidade de mais rodovias, todas elas muito bem pedagiadas e seguras. Ficamos todos muito felizes por estar dirigindo numa estrada que é um tapete, sem pensar que poderíamos estar lendo um livro num trem saindo da Barra Funda em direção à Pampulha.
Mais carros, mais estradas, mais pedágios, mais manutenção de rodovias, mais empreiteiras coordenando o poder, todo o mundo civilizado em direção a um ponto e nós a outro.
Lembro quando o prefeito Kassab... ou foi o Serra? Nem sei mais, tanto faz. Lembro quando um desses gastou milhões de reais na expansão da Marginal do Rio Tietê. Foi gasto um dinheiro absurdo para liberar espaço para mais carros, na mesma época vi uma reportagem sobre uma marginal em um rio na Coréia do Sul. Eles retiraram a avenida marginal abrindo espaço de lazer ao longo do rio. O que fizeram com os carros que por lá passavam? Nada. Ampliaram a oferta de transporte público, simples assim.
Fato: quando há concorrência, o serviço melhora. No Brasil existem os monopólios que geram demandas específicas e isto atrasa abertamente o desenvolvimento em todas as áreas em que esta palavra se aplica: social, educacional, econômica e por aí vai.
Por aí vai, mas não vai. Ficamos parados em aeroportos subutilizados, em rodoviárias mal elaboradas, em estradas esburacados fora do eixo Sul/Sudeste, estradas hiperpedagiadas quando bem equipadas (e caras, muito caras), falta de investimento em tecnologia logística, uma malha de transporte kubitschekiana sem a menor perspectiva de mudança para os próximos cinquenta anos.
Chegam a ser cômicas algumas propostas para a integração do transporte elaboradas pelo último governo, como o da placa de veículos única para o Mercosul. Nossa!!! Estamos aí sim perto da integração do mercado comum, uma balela sem tamanho. Deve haver algum empresário produtor de placa torcendo muito, muito mesmo pra que isso ocorra o mais breve possível e de forma visceral, sem retorno.
Enquanto isso ficamos parados nos pontos de ônibus, no meio da estrada esburacada, na fila do pedágio, em casa sem trabalhar no meio da greve dos caminhoneiros, pagando caro por um serviço de péssima qualidade e torcendo para que ao fim do mês sobre algum pra economizar e dar a entrada no carro dos sonhos. Afinal, um carro significa liberdade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário