Irresponsável
e sem memória. Somos nós brasileiros o suprassumo do descaso.
Essa
greve se iniciou quando feita a opção há mais de cinquenta anos pelo transporte
rodoviário em detrimento ao ferroviário, um cúmulo num país de dimensões
continentais não haver ferrovias cortando o país de fora a fora levando carga e
pessoas a um custo mais acessível, gerando concorrência entre os modais.
Não
acredito estar sendo infantil exteriorizando minha indignação em vez de
apresentar uma visão mais científica, como é o caso corrente deste blog. É que
está tudo tão na cara. Não vejo motivo algum para numa cidade como Guarulhos,
por exemplo, terem extinto as linhas de trem para implantação de transporte
sobre rodas. Não por coincidência na mesma época do presidente Juscelino abrir
o Brasil para as grandes montadoras.
Acredito ter havido uma onda rodoviária encabeçada por mídia e marketing bem elaborado, levando a população pensar que ônibus (no caso de Guarulhos) e caminhões fossem uma melhor opção.
O paisano médio não tem que se preocupar com a mobilidade da cidade e logística de cargas ao redor do Brasil, tem coisas mais imediatas a pensar tipo: como chegar ao trabalho pela manhã e voltar pra casa à noite.
Acredito ter havido uma onda rodoviária encabeçada por mídia e marketing bem elaborado, levando a população pensar que ônibus (no caso de Guarulhos) e caminhões fossem uma melhor opção.
O paisano médio não tem que se preocupar com a mobilidade da cidade e logística de cargas ao redor do Brasil, tem coisas mais imediatas a pensar tipo: como chegar ao trabalho pela manhã e voltar pra casa à noite.
Engraçado
e trágico que no mesmo ano da reimplantação do transporte sobre trilhos em
Cumbica (um trem que leva ao aeroporto que não chega ao aeroporto), então,
no mesmo ano da reimplantação do trem guarulhense ocorre a greve dos
caminhoneiros parando o Brasil inteiro, fechando rodovias e desabastecendo
postos de gasolina, mercados e hospitais.
Esse
caos foi gestado há muito tempo, mas ganhou esta grandiosidade também por conta
dos últimos vinte anos de governos com políticas de crédito irresponsáveis. O que aconteceu?
Nas
duas últimas décadas foi dado incentivo para a população comprar veículos
pesados, os caminhões. Que transportavam diuturnamente commodities do interior
para os portos, e produtos xing ling dos portos e aeroportos para o interior do
Brasil. Quanto mais faltavam caminhões mais o governo incentivava o crédito,
mais se compravam caminhões. O preço do frete nas alturas. Era muito bom para
todos (todos?).
A China, o maior comprador de aço, minérios e tudo o que era produzido aqui, crescia dois dígitos ao ano. O saco parecia não ter fundo. Fizemos uma copa do mundo, por que ferrovia? Fizemos uma olimpíada.
A China, o maior comprador de aço, minérios e tudo o que era produzido aqui, crescia dois dígitos ao ano. O saco parecia não ter fundo. Fizemos uma copa do mundo, por que ferrovia? Fizemos uma olimpíada.
Quando
a China parou de crescer tanto, (tanto, porque ainda cresce invejáveis seis a
oito por cento ao ano) as empresas brasileiras pararam de vender e comprar e
demitiram pessoas que também pararam de comprar. Tudo isso levou-as a
transportarem menos. Com muitos caminhões no mercado e pouco a ser transportado
o capitalismo mostra o que tem de mais racional e alguns diriam selvagem: muita
oferta, pouca procura, preço no chão.
Em
qualquer país civilizado os caminhoneiros que não conseguissem bancar seus
caminhões mudariam de ramo, o mercado se adaptaria. Alguns bancos tomariam
alguns caminhões, seriam obrigados a negociar as dívidas com os caminhoneiros
porque nenhuma instituição financeira quer ser dona de vários caminhões apodrecendo
e desvalorizando-se em pátios de leilão. Alguns transformariam seus veículos em
oportunidades de outros negócios e bora tocar a vida e crescer realizando
nossos sonhos.
Não
no Brasil. No Brasil os caminhoneiros exigiram que o governo federal instituísse
uma tabela para fretes obrigando os contratantes a pagar um valor mínimo quando
o mercado claramente dizia que o preço pelo seu produto (o frete) já não valia
o que valera há anos. Havia (há) um excesso de produto, mão de obra rodoviária, e uma
baixa procura. Ou seja, é possível negociar um preço mais baixo por este serviço,
o que é triste demasiado triste, mas é o que ocorre numa livre economia de
mercado.
Mas
como foi dito na primeira parte deste texto, no Brasil o transporte rodoviário
é onipresente, magnânimo e não está disposto a entender de economia básica. Se
não se transporta pelas rodovias, que tal as hidrovias, ferrovias, transporte
aéreo? Em caso de greve, ou lock out, como foi o caso, algum problema haveria, mas nunca o caos.
No Brasil o
caos foi implantado cinquenta anos atrás e impulsionado nos últimos dezesseis
por irresponsáveis governos populistas que não pensaram em nada além de se
perpetuarem no poder através de uma agenda no mínimo estúpida, para não dizer
criminosa.
Ao fomentar o
uso de automóveis e caminhões criou-se a necessidade de mais rodovias, todas
elas muito bem pedagiadas e seguras. Ficamos todos muito felizes por estar
dirigindo numa estrada que é um tapete, sem pensar que poderíamos estar lendo
um livro num trem saindo da Barra Funda em direção à Pampulha.
Mais carros,
mais estradas, mais pedágios, mais manutenção de rodovias, mais empreiteiras
coordenando o poder, todo o mundo civilizado em direção a um ponto e nós a
outro.
Lembro quando
o prefeito Kassab... ou foi o Serra? Nem sei mais, tanto faz. Lembro quando
um desses gastou milhões de reais na expansão da Marginal do Rio Tietê. Foi gasto
um dinheiro absurdo para liberar espaço para mais carros, na mesma época vi uma
reportagem sobre uma marginal em um rio na Coréia do Sul. Eles retiraram a
avenida marginal abrindo espaço de lazer ao longo do rio. O que fizeram com os
carros que por lá passavam? Nada. Ampliaram a oferta de transporte público,
simples assim.
Fato: quando
há concorrência, o serviço melhora. No Brasil existem os monopólios que geram
demandas específicas e isto atrasa abertamente o desenvolvimento em todas as
áreas em que esta palavra se aplica: social, educacional, econômica e por aí vai.
Por aí vai,
mas não vai. Ficamos parados em aeroportos subutilizados, em rodoviárias mal elaboradas,
em estradas esburacados fora do eixo Sul/Sudeste, estradas hiperpedagiadas
quando bem equipadas (e caras, muito caras), falta de investimento em
tecnologia logística, uma malha de transporte kubitschekiana sem a menor
perspectiva de mudança para os próximos cinquenta anos.
Chegam a ser
cômicas algumas propostas para a integração do transporte elaboradas pelo
último governo, como o da placa de veículos única para o Mercosul. Nossa!!!
Estamos aí sim perto da integração do mercado comum, uma balela sem tamanho. Deve
haver algum empresário produtor de placa torcendo muito, muito mesmo pra que
isso ocorra o mais breve possível e de forma visceral, sem retorno.
Enquanto isso
ficamos parados nos pontos de ônibus, no meio da estrada esburacada, na fila do
pedágio, em casa sem trabalhar no meio da greve dos caminhoneiros, pagando caro
por um serviço de péssima qualidade e torcendo para que ao fim do mês sobre
algum pra economizar e dar a entrada no carro dos sonhos. Afinal, um carro
significa liberdade.
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