quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Bento XVI, Cosme Velho e narcotráfico

    
      Não tenho opiniões firmes a respeito de minha espiritualidade. Mas tenho algumas posições muito mais que liberais sobre as religiões. 
     Acredito que todas as igrejas são objetivas no que fazem de melhor: promover a obscuridade. 
     Mas também sei que todas são muito coerentes. Gosto disso nelas, me fazem permanecer distante da maioria. 
      Mas permitam-me ser mais claro.
     Discordo quando as correntes GLBTs colocam na pauta questões como a mudança nos dogmas da igreja católica, buscando promover o que se convencionou chamar de "casamento gay", aceitação de uso de camisinha, e coisas do tipo.
     Isto apenas comprova o quão distantes estão de questões pertinentes e verdadeiras. 
     A milhas do real problema.
     A Igreja Católica não tem que aceitar o casamento gay, não tem que promover o uso de camisinha, não tem que nada. Isso é papel do Estado.
     E nem temos que aceitar isso, quanto mais as pessoas se aproximarem de conceitos científicos, técnicos e acadêmicos; menos aceitarão o que pastores, rabinos ou padres pregam sem conhecimento nenhum dos mecanismos que fazem o mundo girar.
     O problema não é a Igreja (ou igrejas) que em alguns momentos cumprem até o papel do Estado quando  este falha, o grande problema é justamente a falha deste Estado. 
     Farei uma comparação horrível, me perdoem os religiosos leitores, ou não, cada um com seus problemas: nas grandes favelas metropolitanas onde faltam equipamentos públicos: segurança, educação, rede de esgoto, limpeza, etc. Onde falta tudo isso sobram intervenções outras como: iniciativas por moradia em invasões de encostas, segurança feita pelo narcotráfico, esgoto lançado em rios e córregos, educação formal trocada pela formação religiosa, programas culturais trocados por passeios com a família à igrejas.
     Sim, comparo a intervenção religiosa na educação à intervenção do narcotráfico na segurança. Aí está o ponto crucial do problema: o fracasso do Estado.
     Imbecis são os que lutam para mudar a igreja, deveriam lutar para melhorar a República, que significa "coisa pública" e é laica, que significa dizer que não deve ter a intervenção de nenhuma religião. Nem católica, nem evangélica, nem budista, nem cientologista, nem nada.
     A Igreja Católica é uma instituição conservadora e faz parte do jogo não aceitarem questões cruciais para a sociedade moderna. 
     Ela é conservadora, por isso que eu não vou lá, não concordo com o que dizem, por isso não repito como verdades.
     Deve fazer um bem danado ao ego das idiotas do grupo Femen mostrarem os peitos na Praça de São Pedro dizendo que o Papa é homofóbico. Ora, se assim acreditam, basta não irem à igreja. 
     E eu sei que a coisa não é tão simples assim, mas se fortalecemos o poder do Estado com educação e todas as prerrogativas que vêm com isto, cada vez menos pessoas acreditarão em amigos imaginários pregados por religiosos mal intencionados. Buscando poder, dinheiro, canais de TV, almas para o seu céu particular.
     Acredito em espiritualidade e tenho uma formação católica, assim como 95% dos brasileiros, mesmo os que se dizem evangélicos, ou sei lá, hare krishnas, todos nós desta imensa amálgama chamada Brasil e que come peixe na Sexta-feira Santa e chocolate na Páscoa, acreditando que isso é seguir os preceitos do Papa.
     Estudando poucos livros sobre o catolicismo, não muitos, poucos. Aprenderíamos que os católicos são contra o sexo antes do casamento e que o relacionamento sexual pra Igreja serve apenas para a procriação, o fruto deste relacionamento nasce com algo chamado de "pecado original", daí o batismo para purificar deste pecado.
     Sexo homossexual não gera filhos, daí sua proibição. A igreja católica é contra o prazer. Quer ser católico? Problema seu, ou sorte sua. Mas vai ler primeiro a respeito.
      Quer ser evangélico? Faça o mesmo. Assim como qualquer outro sistema de crenças.
     Buscar que o Papa mude algo de foro tão particular para sua Igreja é querer que ele transforme sua religião em outra, se você quer que a religião seja outra, mude de religião. É o que fazem os brasileiros mudando para o protestantismo, o que para mim é outro erro, erro maior que permanecer no catolicismo. 
     Digo sem medo de errar que, no Brasil, os católicos são mais liberais que os evangélicos. Embora ambos sejam o que toda religião é: retrógrada. 
     O problema não é discutir religião, mas a intervenção destas no papel do Estado, impedindo que políticas públicas sensatas e de acordo com nosso tempo sejam postas em prática. Esses religiosos, não as religiões, se elegem vereadores, deputados, senadores e não trabalham para o povo, tal qual diz a constituição de nosso país que como já disse, é laico. Trabalham para o conservadorismo próprio da instituição religiosa que defende. Ou para interesses pessoais, essa é a verdade.
     Pouco me importa se você acredita ou não no pecado original, pessoas transam e contraem o vírus da Aids, portanto, é necessária uma política pública que atenda a esta demanda, caso contrário nos transformaríamos num país de "aidéticos" com todo o sentido pejorativo do termo entre aspas.
     Pouco importa se a religião é a favor ou contra o aborto, (em geral são contra), mas há milhões de abortos sendo feitos no Brasil de forma precária, improvisada e imunda. Sem contar as crianças encontradas em latas de lixo, caixas de sapato. Ao que é da religião a religião, ao que é da República a República. 
     Não se pode aceitar fatos como o da última eleição pra presidente no Brasil, vencida pela atual presidente Dilma Rousseff, em que a posição liberal quanto ao aborto da presidenta foi adulterada para atender a áreas conservadoras do poder. Entenda conservadoras como religiosas.
     Também não pensem que eu seja tão ignorante a ponto de achar que tudo isso é tão simples assim, é claro que eu sei que as diversas Igrejas querem poder, que a discussão sobre a influência das massas vai além de crenças, que a educação formal está repleta de intervenções absurdas, inclusive por parte de professores que preferem ensinar suas crenças a seguir o conteúdo programático, se apoiando em algo chamado liberdade de cátedra, quando utilizam esta cátedra para cooptar pensamentos para ideologias e religiões próprias.
     Isso não acontece apenas no Brasil, mas no mundo inteiro. Acho que é a globalização.
     As igrejas sempre vão se intrometer nas questões do Estado, nenhum liberalzinho se incomoda quando esta intromissão é um feriado santo como o de Corpus Christ, mas fica todo emputecido quando o Papa diz que é contra a camisinha.
     Minha solução é bem simples: o Papa que não use camisinha e diga pra ninguém usar, mas que os países da África façam com o Vaticano o que o Vaticano faz com os países africanos - ignore. E nós também.
     O que não dá pra ignorar é a intervenção religiosa no Estado brasileiro, há casos de grupos evangélicos que invadiram escolas proibindo a leitura de livros do Monteiro Lobato - por conter magia; de Jorge Amado - pelo conteúdo sexual; Darwin - por negar o criacionismo. Onde chegaremos? Vão proibir a leitura de Machado de Assis por ele ser chamado de Bruxo do Cosme Velho e ter conteúdo esotérico?
     Quanto estas crianças estão perdendo. Quanto todos perdemos?
     Podem contestar se quiserem, não estou falando a respeito de crenças, dogmas ou sacramentos. Falo da participação religiosa nas decisões do Estado. Quanto menor for esta participação, maior é a evolução social e bem estar das comunidades ao redor do globo.
     O século XX foi um dos séculos em que a Igreja menos interferiu nestas decisões, pelo menos abertamente. E foi algo bom, ou alguém aqui prefere viver como se vivia nos idos de 1800?
         De quem foi a culpa pelos avanços científicos? Das religiões?
     Agora, achar que a homofobia é culpa do Papa? Homofobia é falta de educação formal, de leitura, de educação em casa e de  respeito. Isso não se combate indo contra as Igrejas, mas indo a favor das escolas, faculdades, centros culturais e de ensino.
       Em lugares assim aprendi a ser a favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo, ser favorável às decisões da mulher em relação ao próprio corpo, aprendi a respeitar ateus, católicos, evangélicos (religiosos verdadeiros, pessoas de fé que respeitam as pessoas de dúvidas como eu). 
     Lendo aprendi a diferença entre aceitar, conviver e tolerar. E sei que num mundo autista como o nosso palavras assim fazem a diferença, mas atitudes fazem muito mais. Sei da importância dos valores morais que só as religiões possuem, são fundamentais em nosso mundo.
     Se você não acredita assim, tudo bem. Eu sou um liberal, por mim você pode acreditar no que quiser que eu respeito.

Mauro Marcel  

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